11/12/2015 09:00
Blog Ponto de Ônibus| Blog Ponto de
Ônibus
ADAMO
BAZANI
Estudos do Centro para Cidades
Sustentáveis da Embarq, associação internacional que reúne especialistas, e
do Banco Mundial mostram que a implantação de BRT pode auxiliar na segurança
viária de uma determinada região.
No entanto, ainda são comuns
acidentes, principalmente atropelamentos, nos corredores exclusivos de
ônibus.
Um dos exemplos foi no Rio de
Janeiro. No início da implantação dos corredores diversas pessoas foram
atropeladas, inclusive gerando protestos por parte de moradores que chegaram
a bloquear via e danificar ônibus. No primeiro ano de operação do Transoeste.
No primeiro ano de operação do sistema, dez pessoas morreram atropeladas
pelos ônibus.
Mas é uma questão de população
acostumar com o BRT, criando uma cultura de respeito aos espaços e
sinalizações, ou também os projetos podem ser melhores?
O Blog Ponto de Ônibus conversou por
e-mail com a presidente da Comissão Técnica "Mobilidade a Pé e
Acessibilidade”, da ANTT – Associação Nacional dos Transportes Públicos, Meli
Malatesta.
A comissão ajuda gestores públicos na
formulação de políticas para melhorar os deslocamentos não motorizados, por
exemplo, como contribui com o Plano de Mobilidade da Capital Paulista.
De acordo com Meli Malatesta,os
planejamentos de corredores com soluções simples aumentariam a segurança das
pessoas que precisam pegar os ônibus ou de quem simplesmente passa ao
entorno.
Ela também defende que os
planejamentos de malhas de transportes levem mais em consideração a
complementação de viagem a pé com foco na necessidade de pedestres,
inclusive, dos que possuem mobilidade reduzida.
"Os corredores e faixas
exclusivas de ônibus em si caracterizam uma situação atípica de circulação
veicular e esta característica pode acarretar algumas situações de perigo
potencial para seus usuários pela produção de falsos cenários de
oportunidades de acesso para quem caminha gerando insegurança de tráfego.”
Com apoio de diversos movimentos em
prol de circulação mais segura, a comissão técnica auxiliou na formulação do
documento PAC Mobilidade Ativa para consolidar políticas de estímulo aos
deslocamentos não motorizados nas cidades brasileiras.
Acompanhe
entrevista na íntegra abaixo
Dentro
do contexto de que os deslocamentos a pé são os mais importantes numa cidade,
já que têm relação com outros elementos na mobilidade urbana, como, na
prática, os planejamentos e execução dos serviços de transportes coletivos,
metroferroviários ou por ônibus, podem melhorar a condição do pedestre?
Certamente. Muitos planejadores
das redes dos sistemas de transporte público coletivo só pensam no seu
cliente imediato, o passageiro, como se ele tivesse aflorado diretamente do
subsolo nas paradas, estações e terminais. Não imaginam que para acessar
estes elementos dos sistemas seus usuários percorrem a pé um trajeto
complementar cuja extensão muitas vezes lhes toma mais tempo do que a própria
viagem em si. Da mesma forma estes planejadores devem se deter no
conhecimento e entendimento das necessidades das pessoas que caminham,
lembrando que o termo pedestre abrange também as pessoas com restrições de
mobilidade e em situação de deficiência física uma vez que as redes de
transporte coletivo são polos de atração e geração de viagens a pé.
Pela
experiência como presidente da Comissão Técnica "Mobilidade a Pé e
Acessibilidade” da ANTP, o que a senhora pode falar sobre os modelos de
faixas de ônibus, corredores de ônibus simples e BRTs já em operação ou que
devem ser entregues à população? Eles contemplam os pedestres ou, em sua
maioria, têm se limitado a ser planos de vias para ônibus sem pensar na
segurança de quem está ao entorno? Perguntamos isso porque recentemente, por
exemplo, os BRTs do Rio de Janeiro se destacaram pelo número de
atropelamentos, em especial no início de operação.
Os corredores e faixas exclusivas de
ônibus em si caracterizam uma situação atípica de circulação veicular e esta
característica pode acarretar algumas situações de perigo potencial para seus
usuários pela produção de falsos cenários de oportunidades de acesso para
quem caminha gerando insegurança de tráfego. Uma delas diz respeito,
por exemplo ao acesso de pedestres às paradas de corredores de ônibus
com paradas situados nos canteiros centrais. Muitos destes acessos
podem ser feitos somente por faixa de travessia de pedestres semaforizadas
situadas no meio da quadra. Usuários que se originam das vias
transversais muitas vezes não conseguem visualizar estas travessias e tentam
acessar estas paradas atravessando as faixas de pedestres que são normalmente
situadas nas esquinas e depois tem que pisotear vegetação existente ou se
espremer junto aos gradis que são instalados até o local onde está a parada,
ou mesmo invadir a faixa onde circula o ônibus em situação de alto
risco. Tudo isso porque quem faz o projeto vê o local de cima, em
"planta” e quem o utiliza o vê de frente, na altura do olhar.
Outra situação que também implica em risco é a programação semafórica que ao
privilegiar o próprio transporte coletivo sujeita seus usuários que ainda
estão a pé a longas esperas e tempos de travessia restritos que
impossibilitam completar toda a extensão de via a ser atravessada numa só
etapa. Esta situação de desprivilegio para o passageiro que ainda está
a pé induz ao desrespeito fazendo-o preferir se arriscar numa travessia
perigosa a perder seu ônibus que se aproxima. Enfim, ao se planejar
estruturas de privilégio ao transporte coletivo não se pode esquecer do seu
principal motivo: o passageiro que ainda é um pedestre.
E
a condição dos pontos de ônibus? Constantemente surgem notícias de pessoas
que morrem atingidas por carros enquanto estavam aguardando o ônibus. Como
melhorar a segurança do pedestre que espera o transporte no ponto?
Os locais escolhidos para acomodarem
os pontos de ônibus devem apresentar condições suficientes para acomodar de
forma segura e confortável seus usuários, considerando-se sempre o
horário de maior concentração de pessoas. Além de largura suficiente,
boa visibilidade, piso regular sempre em boas condições, revestimento
antiderrapante, boas drenagem, cobertura e iluminação, outros cuidados com o
trânsito motorizado devem ser tomados como sinalização apropriada e outros
elementos para redução da velocidade do tráfego geral.
É
possível desenvolver trabalhos para a melhor capacitação de motoristas de
ônibus sobre a segurança de pedestres e ciclistas e como fazer isso?
Aparentemente, apesar de todas as campanhas, ainda é forte a sensação de que
há uma disputa de espaço nas cidades?
Capacitação dos motoristas de ônibus,
cobradores, fiscais, enfim de todos os profissionais envolvidos com o
planejamento, projeto e operação dos sistemas de transporte coletivo
são sempre necessárias e bem vindas até para abrandar esta situação de
disputa pelo espaço público destinado à mobilidade nas cidades brasileiras,
sensibilizando-os para os usuários mais vulneráveis da via: ciclistas e
sobretudo pedestres. Tenho informação que muitas cidades, inclusive São
Paulo já começaram este trabalho.
Como
também tornar os pedestres e ciclistas mais disciplinados e respeitosos? A
sensação é que muitos ao saberem que são prioridade pensam que podem tudo no
trânsito.
A Educação de Trânsito e Cidadania
como matéria obrigatória nas escolas é essencial para preparar as pessoas
para compartilhar com segurança e harmonia o espaço público das cidades
destinado à mobilidade. Infelizmente a legislação que indica como
as pessoas devem compartilhar estes espaços, ou seja o CTB – Código de
Trânsito Brasileiro, que institui os direitos e os deveres dos usuários do
sistema viário, não é totalmente explorado nem no único momento em que
é ensinado, os usuários da via que têm oportunidade de conhecê-lo, ou
seja, os usuários habilitados, que tiram a CNH. Os Centros de
Formação de Condutores se detém mais em apontar o que os motoristas podem
fazer nas vias do que prepará-los para compartilhar estes espaços para os que
não necessariamente conhecem essa lei, que são os usuários mais
vulneráveis da via: ciclistas e pedestres. E estes por sua vez
assumem posturas de "quem pensam que podem tudo no trânsito” porque não
confiam no respeito pelos motoristas aos seus direitos mais básicos, ao ponto
de inventarem um gesto de mão para que os motoristas daqui obedeçam o que já
é proposto pela lei: a prioridade do pedestre que atravessa na faixa.
Conte
um pouco mais do PAC Mobilidade Ativa e como ele pode melhorar circulação das
pessoas, se as propostas foram seguidas. Não existe hoje nenhum financiamento
do PAC para os deslocamentos a pé e de bicicleta?
Nosso trabalho como setor da
sociedade civil que atua no sentido de proporcionar à Mobilidade a Pé a
importância que ela merece na divisão dos espaços e do tempo das áreas
públicas das cidades brasileiras destinadas à mobilidade juntamente com
outras entidades parceiras que realizam o mesmo trabalho como a Associação
Cidadeapé, Corridaamiga, Sampapé, entramos como parceiros das entidades
brasileiras de cicloativismo na criação de um documento com a proposta do PAC
Mobilidade Ativa como forma de consolidar políticas de estímulo à Mobilidade
Ativa nas cidades brasileiras através da obtenção de recursos para a
implantação e consolidação destas redes. A Lei Federal da Mobilidade
Urbana (lei federal 12.587/2012) institui a obrigatoriedade de Plano Diretor
de Mobilidade aos municípios que busquem recursos do governo federal para
serem aplicados em mobilidade urbana, institui a obrigatoriedade da
priorização da mobilidade não motorizada, ou mobilidade ativa, nestes planos.
Quais
as contribuições da Comissão para o Plano de Mobilidade de São Paulo?
A Comissão Técnica de Mobiliade a Pé
e Acessibiliade da ANTP tem atuação nacional e neste ano contribuiu para a
consolidação do assunto Mobilidade a Pé no PlanMob de São Paulo através da elaboração
de um documento contendo uma análise crítica da proposta preliminar elaborada
pela SMT – Secretaria Municipal de Transportes. As indicações e
necessidades apontadas neste documento, posteriormente enviado à SMT,
foram em grande parte aproveitadas na elaboração de sua revisão que
atualmente encontra-se em fase final de discussão junto às entidades
representativas anteriormente mencionadas além da ANTP.
Saiba
mais sobre o assunto no site da ANTP
Recentemente,
você se machucou andando em São Paulo. Como e onde foi isso? E, num olhar de
técnica e cidadã, faça uma avaliação de como é caminhas na cidade?
Fraturei o tornozelo esquerdo
torcendo-o violentamente ao pisar numa irregularidade de uma calçada situada
num bairro paulistano central e de alto poder aquisitivo. Estava
calçando tênis, então o tipo de calçado não colaborou para a ocorrência do
acidente, o problema foi a má condição da calçada mesmo. Este acidente
me obrigou a uma imobilização total de 2 meses e atualmente estou em
imobilização parcial com fisioterapia. Além das consequências
indesejáveis do acidente em si, tive grande prejuízo material ao ter que abrir
mão de muitas atividades profissionais. Assim como eu várias pessoas
passam pela mesma situação nas cidades brasileiras acarretando um enorme
prejuízo ao SUS e suas vidas pessoais em decorrência de um problema muito
sério, mas de solução simples e barata. Este tipo de acidente, que não
entra nas estatísticas de trânsito brasileiras e supostamente em nenhum país
do mundo, gera mais atendimento em prontos socorros em todo o país do que os
outros tipos de acidentes de trânsito. A "deseconomia” gerada atinge
valores monetários altíssimos e poderia ser evitada com medidas muito simples
e de baixo custo. A legislação adotada para a construção e manutenção de
calçadas em São Paulo e na maioria das cidades brasileiras que institui ao
poder privado a construção e manutenção das calçadas e ao poder público sua
fiscalização já se mostrou ineficaz e injusta para com a Mobilidade a Pé uma
vez que a pista por onde circulam os veículos e de inteira responsabilidade
do poder público. Esta diferença de tratamento dos espaços públicos
destinados à mobilidade urbana e a indiferença do poder público e da
sociedade civil para este problema aponta a pouca valorização que é atribuída
à caminhada , desestimula sua prática e induz a uma cidade desigual, não
democrática e perigosa.
Adamo
Bazani,
jornalista especializado em transportes
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sexta-feira, 11 de dezembro de 2015
Especialista da ANTP defende mais atenção ao pedestre no planejamento de corredores de ônibus
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