sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Por mobilidade urbana sustentável e segura


Pere Navarro Olivella  
As cidades são uns dos principais patrimônios de nossos países e temos que nos acostumar a pensar nas cidades e das cidades, não esquecendo que elas são potentes alavancas de crescimento e emprego e de que todas as grandes mudanças começam nas cidades.
Compartilhar ruas, respeitar o mobiliário urbano, cumprir normas de convivência são elementos chave do que se conhece hoje como pedagogia social. A rua tem sempre sido uma grande escola e nos EUA existe um interessante movimento a favor de crianças irem a pé à escola, como resposta ao excessivo protecionismo a que os estamos acostumando.
Dentro das imensas mudanças que se estão produzindo em nossas cidades, está a forma e maneira de nos deslocarmos.
Todos aprendemos que a espiral do trânsito não poderia continuar aumentando indefinidamente e que a construção de novos acessos, vias e marginais e novos estacionamentos não era a solução, porque só nos levava a gerar mais trânsito e mais veículos.
Todos havíamos descoberto que barulho, poluição, deterioramento da paisagem urbana, trânsito e a agressividade que decorre da presença maciça do automóvel, são incompatíveis com o objetivo de melhorar a qualidade de vida em nossas cidades. Assim, chegamos à conclusão de que a situação não podia continuar, que o modelo estava esgotado e tínhamos que buscar novas formas de organizar deslocamentos com perspectivas de futuro.
A primeira mudança foi semântica, mas de grande significado. Até esta data havíamos falado de circulação porque o protagonista era o automóvel e, no futuro, falaríamos de mobilidade porque o protagonista passava a ser o cidadão em suas diferentes formas de deslocamento.
Todos concordamos em que deveríamos recuperar a importância dos deslocamentos a pé e que nosso clima e configuração das cidades favoreciam este modo de locomoção. A partir deste principio, as calçadas foram alargadas, os centros dos bairros reduzidos ao tráfego e a sinalização de rotas e informação para pedestres se incorporaram a paisagem urbana. Os especialistas assim nos mostraram que a via pública devia ser vista sob a perspectiva da altura de uma criança, ou das limitações da pessoa com mobilidade restrita, para que o projeto desse certo.
A bicicleta, como modo de transporte, tem sido aceita como uma opção de futuro e como já acontece nas cidades do norte da Europa, pouco a pouco vai ganhando seu espaço. Primeiro através das faixas próprias e depois pelos sistemas públicos ou municipais, para bicicletas.
A firme aposta no transporte público supõe a extensão de faixas reservadas a ônibus e táxis, a melhora das frequências, a qualidade do serviço e até a recuperação dos bondes em algumas cidades, com a intenção de ir normalizando seu uso como forma moderna de deslocamento.
Dentro do transporte privado, a distribuição de mercadorias em constante aumento é muito necessária à manutenção da atividade econômica de uma cidade, tem sido priorizada em relação aos deslocamentos em carros particulares. A revisão dos espaços destinados à carga e descarga de mercadorias, a limitação do tempo de permanência para os veículos comerciais e a melhora na disciplina, têm permitido organizar e agilizar uma atividade cujas exigências em termos de mobilidade não tem sido sempre valorizadas o suficiente.
Entre os deslocamentos em veículos particulares, as motos estão e irão adquirir protagonismo especial por razões de economia de espaço, como alternativa urbana ao automóvel. Pouco a pouco, a presença das motocicletas em nossas ruas já está se tornando uma imagem característica. As campanhas para melhorar segurança e disciplina, ações para reduzir o impacto acústico e a criação de vagas de estacionamento nas ruas para liberar as calçadas, têm configurado uma política própria para compatibilizar a importante presença das motocicletas com as necessidades dos cidadãos.
O automóvel tem e continuará tendo um papel importante nos deslocamentos, mas de outra maneira. Sua massificação obrigou à reflexão do que se chama "o uso racional do carro”, que leva à conclusão de que só deve ser usado para movimentos excepcionais no centro da cidade e não como meio de transporte quotidiano e que seu uso deve se restringir a distâncias medias ou longas e não a curtas. O próprio setor automotivo está se adaptando a esse novo cenário por meio de veículos mais cívicos, ou cidadãos, com o slogan "limpo e seguro” porque a demanda assim se impõe.
O estacionamento está se adaptando às novas necessidades através da construção de novas unidades fora das ruas, com o objetivo de que todo morador possa dispor de uma vaga fora das vias públicas e assim, progressivamente eliminando as vagas para recuperar espaços necessários à circulação; como medida de contenção ao uso generalizado do automóvel nas zonas centrais, o que está ocorrendo em todas as grandes cidades europeias.
A maior sensibilidade ao meio ambiente e a constatação de que 40% das emissões de CO2 são ocasionadas por circulação motorizada, nos tem permitido escalonar um conjunto de práticas relativas a estas mudanças, denominado de "mobilidade sustentável”.
Mas tal mobilidade além de sustentável, deve ser segura e o momento é de priorizar segurança sobre fluxo, proteger os mais vulneráveis – pedestres e ciclistas – acalmando o trânsito com criações de "zonas 30” em ruas de origem e destino e não nas de passagem; é importante explicar que o respeito aos semáforos e a prioridade nos cruzamentos são básicos e fundamentais para segurança urbana e as faixas de pedestres são obrigação de todos e que as bicicletas também devem cumprir as normas e levar elementos para reflexão, entre muitas outras coisas.
Nossas cidades continuarão crescendo e com elas, as necessidades de locomoção. A solução dos problemas de mobilidade se transformou em um dos grandes desafios aos administradores públicos e de seus acertos ou erros dependerá em grande parte a competitividade futura de seus territórios.
Este é o desafio sugerido, conseguir cidades mais humanas, mais razoáveis, mais sustentáveis e mais seguras, ou dizendo de outro modo: deixar às futuras gerações, cidades das quais possamos nos orgulhar.

Pere Navarro Olivella - Engenheiro industrial e inspetor de Trabalho, foi gerente de mobilidade na prefeitura de Barcelona de 1999 a 2004, Diretor Geral de Trânsito do Governo da Espanha de 2004 a 2012 e atualmente é conselheiro da embaixada espanhola no Marrocos

ANTP

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