sexta-feira, 15 de maio de 2015

Carro pra quê?

Blog do Noblat
Uma reportagem de Simone Cavalcanti publicada no Valor Econômico, encabeçada pela matéria "Compartilhar motorista ou carro pode ser opção a veículo próprio”, discute uma série de alternativas à posse do automóvel para quem não quer abrir mão do transporte individual. Vários pontos interessantes e atuais são levantados, inclusive o polêmico serviço proporcionado pelo aplicativo Uber, que vem provocando a fúria de taxistas nas mais diversas cidades do mundo em que é oferecido. Aliás, a justiça brasileira acaba de suspender o serviço e a disponibilização do aplicativo em todo o país.



Mas voltemos à questão da propriedade do automóvel. Sabemos todos, embora nem todos admitamos, que ter um carro não é apenas dispor de um instrumento que facilita nossa mobilidade. O carro tem um valor simbólico fortíssimo. Ele é expressão de poder e sucesso, difícil de mensurar em termos monetários, pelo menos nos termos em que estamos acostumados a raciocinar. Ainda assim, vale a pena dar uma olhada na racionalidade econômica. Quem sabe assim fique mais claro o peso do rapaz nas nossas vidas.

Numa das matérias em que trabalha o tema de sua reportagem, intitulada "Vou de carro?”, Simone Cavalcante recorre a alguns especialistas em finanças para mostrar vantagens e desvantagens do uso de carros na cidade de São Paulo. Um deles, Mauro Calil, calculou custos anuais para sustentá-los, comparando diversas situações: carros com valores de R$ 30, 40 e 50 mil, rodando 5, 13 e 24 km por dia.

É claro que há simplificações nesses cálculos – mas, se não são considerados todos os custos fixos, também há custos variáveis que não mereceram figurar nas contas. Elas por elas, o quadro resultante do cálculo é bastante realístico. O que pode impressionar pessoas um tanto distraídas é quanto pesam os custos fixos no total dos gastos. Para o carro mais caro que roda mais diariamente, os custos fixos representam 81% do total. Já para o carro mais barato que roda menos, a proporção é bem mais alta: nada menos que 94% do custo total.

Como diz outro especialista ouvido, o professor Samy Dana, "carro não é investimento, é um componente de consumo”. Mais que isso, uma vez adquirido – com todos os custos não considerados no cálculo de Mauro Calil, diga-se de passagem – não faz sentido deixar o carro parado ou pouco usado. Afinal, os custos variáveis são uma parcela quase irrisória no sustento do rapaz.

Mas o que estamos fazendo com nossas cidades? É esse o caminho que queremos para nossas economias domésticas e para a economia do país? Será que não vale a pena refletir melhor sobre nossas prioridades?

Paulo Cesar Marques da Silva- Engenheiro, doutor em estudos de transportes pela University College London (Reino Unido), é professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília