segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Cidade para pessoas, artigo de EDUARDO BIAVATI

A "área 40" --como é chamado o conjunto de vias em que a velocidade máxima é 40 km/h-- é um passo importante para um trânsito mais seguro em São Paulo que complementa e reforça a busca por uma mobilidade mais justa, mais sustentável e mais saudável.
A velocidade mora no coração da violência do trânsito de nossas cidades. Nenhum outro fator de risco contribui de modo tão decisivo para uma colisão ou atropelamento e para a gravidade das lesões deles decorrentes.
Morremos no trânsito ou sobrevivemos despedaçados por causa da velocidade que ultrapassou o limiar da tolerância humana à absorção da energia no impacto entre o corpo e a máquina.
É assim que pedestres, por exemplo, correm risco de 80% de perderem a vida ao serem atingidos por um veículo a 50 km/h, em oposição ao risco de 10%, quando a velocidade no atropelamento é 30 km/h.
No intervalo de 20 km/h, desprezível para muitos motoristas, reside a possibilidade de preservar uma vida. Ninguém deveria se surpreender que os pedestres ainda formem o principal grupo de vítimas na maior cidade da América Latina.
Deveríamos ter pensado, projetado e desenvolvido o grande sistema do trânsito em torno dessa vulnerabilidade do corpo humano, mas é claro que não foi isso que ocorreu.
Pelo contrário, uma São Paulo que "não pode parar" seguiu rasgando avenidas expressas e destruindo vizinhanças, sob a égide do delírio que ainda vemos em comerciais na televisão: uma cidade para o carro, de vias sempre livres e, principalmente, sem pessoas.
Mas o que é uma cidade senão suas pessoas? Diante da prioridade dos carros e dos perigos reais das ruas, dedicamos muita energia à tarefa de "educar" pedestres e ciclistas a encontrarem seu lugar na cidade. Dizia-se que morriam muitos pedestres em São Paulo porque eles vinham de longe e pouco entendiam a linguagem do trânsito.
Falhando o esforço educativo, restava ainda a possibilidade de contê-los com grades em certos cruzamentos críticos. Mas sobre a alta velocidade dos veículos --que tornava crítico o cruzamento, o que os ameaçava a cada travessia-- pouco se falava.
Nossos limites de velocidade atuais declaram que inexiste a possibilidade de convivência entre veículos, pedestres e outros usuários não motorizados, a não ser, é claro, sob conta e risco desses últimos.
Em São Paulo, a introdução da "área 40", afirma, ao contrário, que esse risco não é um problema apenas dos cidadãos, mas também do poder público, a quem compete exclusivamente tanto fiscalizar a velocidade, como regulamentar a velocidade máxima do trânsito em cada via da cidade.
Embora temida politicamente e convenientemente esquecida nas gavetas dos órgãos gestores do trânsito, a redução da velocidade é uma ferramenta indispensável da gestão da segurança viária.
Reduzindo a distância percorrida pelo veículo e a distância necessária para a frenagem, a velocidade menor intervém diretamente na chance de uma colisão ou atropelamento. Interfere principalmente na gravidade dos ferimentos no corpo desprotegido do pedestre ou do ciclista quando o impacto ocorrer.
Promover uma convivência mais humanizada entre veículos motorizados e não motorizados, condutores, ciclistas e pedestres, no espaço comum das ruas é coisa que se faz sem pressa, com baixa velocidade, como nos ensinam as cidades europeias há tanto tempo.

Trecho da Mobilidade e Conjuntura da ANTP



Ventos da mudança,  

Duas mudanças na mobilidade urbana vieram para ficar: os projetos cicloviários e os corredores de ônibus. 

Dizendo de maneira mais abrangente, a sociedade começou a assumir o uso mais equânime e justo da rua, antes tomada pelo transporte individual motorizado.

Como não poderia ser diferente, principalmente quando mudanças tocam em privilégios arraigados e já tidos como "naturais", as reações já se fazem sentir. Muitas vezes desproporcionais, outras vezes até com o despropositado apoio de parte da mídia que se julga "especializada" no tema.

Como não dá para brigar com a notícia, tampouco com a verdade, basta ler os jornais com um mínimo de boa vontade para sentir os ventos da mudança.,,,,,

Temos bons exemplos de soluções, produzimos excelentes técnicos e já oferecemos, no passado recente, bons modelos de paradigmas, hoje copiados por grandes cidades do planeta...... 

O que vemos agora é que, finalmente, começamos a nos mover. E os exemplos citados, sopram os bons ventos da mudança........

Trecho do Mobilidade e Conjuntura 80, da ANTP