terça-feira, 10 de maio de 2016

Propostas que deixariam as passagens de ônibus mais baratas não saem do papel há anos

02/05/2016 12:30 - Adamo Bazani

Ao menos 60 viagens de ônibus por segundo não têm cobrança de passagem. O número faz parte do universo de 40 milhões de deslocamentos diários feitos por ônibus urbanos e metropolitanos no Brasil e representa que de seis viagens de ônibus, uma é gratuita, de acordo com a NTU - Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, que reúne em torno de 500 viações no país.
Até aí, não haveria nenhum problema na concessão destas gratuidades, caso não houvesse a atual injustiça na forma de financiamento destes benefícios. O custo recai quase que exclusivamente sobre o passageiro pagante.
Somado à constante perda de demanda dos ônibus, que chegou a 900 mil passageiros por dia em 2015, à ineficiência dos sistemas que não são remodelados pelas licitações realizadas quase que de forma improvisada, e do alto custo gerado pelos congestionamentos, que representam em torno de 15% dos gastos para operação de transportes, de acordo com o IPEA, o excesso de gratuidades explica o fato de a passagem de ônibus hoje no Brasil ser tão cara.
Não adianta o MPL - Movimento Passe Livre e outras organizações forçarem uma reivindicação de tarifa zero para todos, sem apresentar propostas que possam sair do papel. Hoje o Brasil nem ao menos consegue resolver o financiamento das atuais gratuidades.
Sim, a passagem de ônibus no Brasil é cara, os serviços ainda não satisfazem plenamente a sociedade, mas a tarifa não cobre os atuais custos.
Alternativas para formas de financiamento dos transportes públicos existem, inclusive em forma de projetos de lei ou propostas de emenda à Constituição, mas pelo andar da carruagem da política brasileira, não devem sair do papel tão já.
Acompanhe algumas:
PEC 179-A/2007 – Cide Municipal: A Proposta de Emenda à Constituição, de autoria do atual secretário municipal de transportes de São Paulo, Jilmar Tatto, quando era deputado federal em 2007, prevê a criação de uma Cide – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – municipal sobre os combustíveis. A PEC ainda tramita na Câmara. Em entrevista ao Blog Ponto de Ônibus, no 15 de janeiro de 2016, o presidente da NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, Otávio Vieira da Cunha Filho, disse que se R$ 0,20 da gasolina fossem destinados aos transportes, seria possível cobrir de 30 % a 35% dos custos dos transportes coletivos, havendo assim uma redução no valor das tarifas. (Relembre
No último dia 28 de abril de 2016, o secretário Municipal de Transportes de São Paulo, Jilmar Tatto, disse em evento na capital paulista que se houvesse uma Cide – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – municipal sobre os combustíveis, cobrando 10 centavos por litro comercializado, a cidade teria uma arrecadação anual extra de R$ 625 milhões. Este valor, de acordo com Jilmar Tatto, seria destinado, por lei federal, para baratear as passagens de ônibus.
A lógica é a busca de uma justiça no uso do espaço urbano e no rateio dos custos de transportes. Quem se locomove de carro ocupa proporcionalmente até oito vezes mais espaço que um passageiro que está no ônibus e polui em torno de 17 vezes mais. Assim, pela proposta, seria justo que esse cidadão contribuísse para os deslocamentos daqueles que poupam o espaço urbano, reduzindo o trânsito e a poluição. Ao reduzir as tarifas, os transportes públicos seriam mais interessantes e um maior número de pessoas deixaria o carro em casa.
Levantamento do IPEA – Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas revela que os congestionamentos nas cidades podem deixar as tarifas de ônibus mais de 15% mais caras:  o congestionamento acarreta um custo adicional na tarifa para os usuários do transporte coletivo, quais sejam: São Paulo (15,8%); Rio de Janeiro (9,6%); Campinas (6,4%); Belo Horizonte (6,2%), dentre outras cidades. Isso porque os veículos de transporte coletivo gastam mais combustíveis e horas de trabalho presos no trânsito.
- PL3866/2015 – Fundo do Idoso para os Transportes: O Projeto de Lei do deputado federal Júlio Lopes prevê o uso da parte das verbas do Fundo Nacional do Idoso para custear as gratuidades para passageiros com idade acima de 65 anos nos transportes urbanos e metropolitanos. A proposta foi remetida no último dia 18 de dezembro de 2015, às Comissões de Seguridade Social e Família; Finanças e Tributação e Constituição e Justiça e de Cidadania. Só depois será encaminhada ao Senado, se passar pelos deputados. O Fundo Nacional do Idoso foi instituído pela lei 12.210, de 20 de janeiro de 2010, para ser “destinado a financiar os programas e as ações relativas ao idoso com vistas em assegurar os seus direitos sociais e criar condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade.” Com a inclusão dos transportes no sexto artigo da Constituição em 2015, sendo classificados agora como direitos sociais, a tramitação deve seguir de maneira mais rápida e sofrer uma contestação a menos.
PEC 01/2015 – Rateio igual da atual Cide: No último dia 27 de abril, a CCJ – “Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania”, do Senado Federal, aprovou a Proposta de Emenda à Constituição PEC 01/2015, do senador Wellington Fagundes, que prevê a distribuição da Cide – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico sobre os combustíveis em partes iguais entre União, estados e municípios. A medida é considerada pelos senadores que participaram da votação essencial para auxiliar os municípios que se encontram em situação financeira delicada e também para ampliar os investimentos em mobilidade urbana. As maiores responsabilidades e, consequentemente custos, para gestão e operação dos transportes são justamente dos municípios. A proposta quer assim tornar mais justa a divisão dos recursos para que os deslocamentos individuais financiem o transporte coletivo. Atualmente, a Constituição Federal destina 29% da arrecadação da Cide-Combustíveis aos estados e ao Distrito Federal e, desse total, 25% são repassados aos municípios. O critério de redistribuição considera o contingente populacional e a posição ocupada dentro do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Em razão disso, algumas cidades recebem mais recursos que outras.
Pelas regras em vigor, de cada R$ 100 arrecadados com a Cide-Combustíveis, a União fica com R$ 71 (71%) e repassa R$ 21,75 (21,75%) aos estados e ao DF. Aos municípios, são repassados apenas R$ 7,25 (7,25%). 
Mas para a PEC vigorar, há um longo caminho: A proposta deve ainda ser submetida a dois turnos de discussão e votação no Plenário do Senado. Se aprovada, seguirá para a Câmara dos Deputados. Não há um prazo para que esta tramitação termine.
OUTRAS PROPOSTAS:
Há também outras propostas do setor de transportes e de especialistas, como por exemplo, a criação de um Fundo Nacional para o Financiamento dos Transportes.  Isso possível agora pelo fato de, através da aprovação no ano passado, da PEC 90 - Proposta de Emenda à Constituição, da deputada Luiza Erundina, os transportes serem classificados pela Constituição como direito social e não apenas serviço essencial, como era antes.
Outras ideias são mais polêmicas, como a criação pelos municípios de pedágios urbanos ou a obrigatoriedade de o empregador pagar o Vale-Transporte para todos os funcionários, independentemente de eles irem trabalhar ou não de transporte público. Seria uma forma de também estimular os deslocamentos de transportes públicos e financiar quem já utiliza trem, metrô ou ônibus.
RECEITAS DEVERIAM AUMENTAR 50%:
Ainda de acordo com a NTU, hoje a operação dos transportes públicos em todo o país custa anualmente R$ 30 bilhões. No entanto, para que o serviço seja adequado, tanto em termos de qualidade quanto para o atendimento geral de uma demanda reprimida, seriam necessários pelo menos outros R$ 15 bilhões, totalizando R$ 45 bilhões anuais para os modelos atuais de sistemas.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes
Blog Ponto de Ônibus