segunda-feira, 25 de abril de 2016

Aplicação da Política Nacional de Mobilidade Urbana para cidades sustentáveis e eficientes

17/04/2016  - Priscila Braga Santiago
Ensaio Crítico apresentado no Curso de Gestão da Mobilidade Urbana da ANTP

Estimativas do Programa das Nações Unidas para Assentamentos Urbanos indicam que a taxa mundial de crescimento urbano é de 1,8% a.a., enquanto a de áreas rurais é de apenas 0,1% (UN-HABITAT, 2005). Diante desse significativo crescimento anual, a organização prevê que em 2030 a população mundial urbana será de cerca de 5 bilhões de pessoas, ou seja, crescimento de 75% desde 2000.  Diante das expectativas, planejar e preparar as cidades para receberem o crescente número de cidadão deve ser uma prioridade dos gestores públicos e da sociedade em geral. Assim, este artigo tem por objetivo promover o debate sobre a importância da implementação efetiva da Política Nacional de Mobilidade Urbana para que as cidades brasileiras tenham um desenvolvimento sustentável. 
Pensar na sustentabilidade da mobilidade urbana é imperativo, dado que, segundo estudos, o transporte e pessoas e mercadorias é responsável por cerca de 30% do total das emissões de gases de efeito estufa, com destaque para os carros particulares que respondem por cerca de 80% dessas emissões (GAIGNE, 2011). Essa preponderância da emissão dos veículos particulares está associada, diretamente, a sua participação na frota. No caso do estado de São Paulo, objeto de estudo deste artigo, esses representam 66,3% da frota (Tabela 01).

Pelo levantamento realizado pela Cetesb (2014), é possível verificar que a frota dedicada à movimentação de cargas no estado de São Paulo representa 15,4% dos veículos registrados. O fato corrobora a informação de que os maiores poluidores nos centros urbanos são os veículos dedicados ao transporte de passageiros. Contudo, os veículos de carga ainda são responsáveis, individualmente, por um significativo montante da poluição local. Nesse sentido, a promoção de uma adequada renovação de frota que permita que a frota circulante atenda aos requisitos definidos Programa de Controle de Poluição do Ar por Veículos Automotores – PROCONVE deve ser foco de gestores locais.
Ainda no que se refere a renovação de frota, deve-se considerar que a mesma lógica aplicada aos veículos de carga é válida para os automóveis. A Tabela 02 apresenta os limites de emissões de CO2 para cada faixa etária de veículos em circulação no país (CONTROLAR, s/d). Os dados evidenciam que os veículos mais novos movidos à gasolina, depois de 2006, emitem 10 vezes menos CO2 que os produzidos entre 1992 e 1996. Para aqueles que utilizam álcool e gás natural o limite de emissão não foi alterado entre 2003 e 2006. Diante disso, ficam evidentes os ganhos ambientais, e sociais, de se incentivar uma renovação da frota de veículos nos centros urbanos a fim de reduzir a emissão per capita dos automóveis.

Tabela 02 – Limites de emissões de CO2 por faixa etária de veículos / Fonte: Controlar s/d
Contudo, a simples renovação da frota com a manutenção da atual dinâmica de mobilidade urbana verificada em cidades como São Paulo não será suficiente para a garantia da sustentabilidade dos centros urbanos. Segundo o Ipea (2011), um dos grandes erros em análise de movimentação urbana é a associação de poluição urbana a veículos grandes. Para o instituto, o problema decorre do fato de que a capacidade produtiva dos veículos não é considerada, o que pode comprometer a definição de políticas públicas voltada à gestão de mobilidade urbana.
Comparativo desenvolvido pela revista The New Economy evidencia que a emissão de CO2 por passageiros é 86,3% maior quando se utiliza automóveis em comparação a emissão dos ônibus. Enquanto os ônibus emitem 66,8 g de CO2 por passageiro, os carros emitem 124,5g e as motocicletas 83,0g. Além da questão de eficiência energética, os ônibus são mais eficientes em termos de utilização do espaço viário. Segundo a Confederação Nacional do Transporte, enquanto os automóveis ocupam 60% do espaço viário e transportam 20% dos passageiros, os ônibus ocupam 25% do espaço viário e transportam 70% dos passageiros (CNT, 2012)
Diante dos fatos, o incentivo à utilização do transporte público coletivo de passageiros nos centros urbanos caracteriza-se como a forma mais sustentável de se promover os deslocamentos de pessoas e bens. A fim garantir a eficiência nos deslocamentos urbanos, o governo federal publicou a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU),lei 12.587/2012, com o objetivo de priorizar o transporte coletivo e o não motorizado.
Com essa meta, foram criados mecanismos para que os municípios racionalizassem o uso do espaço urbano como: (i) restrição à circulação em locais e horários definidos; (ii) estipulação de padrões de emissão de poluentes; e (iii) dedicação de espaço exclusivo nas vias públicas para o transporte coletivo e meios não motorizados. Complementarmente, foi definida a obrigatoriedade de elaboração de um Plano de Mobilidade Urbana para municípios acima de 20 mil habitantes.
Passados três anos da publicação da PNMU pouco foi feito. De fato, o que se percebeu foi a ampliação de incentivos ao transporte motorizado individual por meio de redução na alíquota de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na aquisição de veículos automotores leves. Esses incentivos resultaram em um significativo aumento da frota circulante na cidade de São Paulo, assim como no restante do país, o que agravou a situação da mobilidade urbana nos principais centros urbanos brasileiros.
Por isso, torna-se urgente o comprometimento com a implementação da Política Nacional de Mobilidade Urbana em sua plenitude. Sociedade e gestores públicos têm de combinar esforços para garantir no médio e longo prazo a reestruturação dos sistemas de transporte no Brasil. Para isso, a estruturação de um plano estratégico para a implantação da política mostra-se como o ponto inicial do processo de reconstrução do transporte urbano no país.
Contudo, é necessário que se considere que a implementação parcial da PNMU não será capaz de solucionar os atuais problemas de mobilidade no país e preparar as cidades para uma população crescente, como indicado pela ONU. Ações de reordenamento urbano, incentivo ao uso do transporte não motorizado - com disponibilização de ciclovias e calçadas adequadas -, restrições de circulação de veículos particulares em áreas de maior aglomeração, promoção de renovação de frota e delimitação de limites de emissões – com implementação da inspeção técnica e ambiental dos veículos-, devem ser desenvolvidas complementarmente e ao mesmo tempo para que a Política Nacional de Mobilidade Urbana seja, de fato, um instrumento capaz de transformar as cidades brasileiras em sustentáveis e eficientes do ponto de vista de mobilidade.
Priscila Santiago - Bacharel em economista, Mestrado Completo e Doutorado em Curso, é Coordenadora de Economia da Confederação Nacional do Transporte, Brasília - DF