terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Artigo de Fausto Morey, Consultor e assessor técnico da STM-SP, no Clipping ANTP

O baixo crescimento econômico apresenta um novo cenário para a realização de PPPs e para a execução orçamentária do setor público. Quais medidas econômicas e legais devem ser adotadas para que seja possível viabilizar obras e projetos importantes para o desenvolvimento nacional?
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A perda de dinamismo das exportações e o persistente baixo nível de investimentos têm puxado o PIB brasileiro para baixo e encerrou 2012 por volta de 1% ao ano *1. A inflação aferida pelo IPCA fechou o ano em 5,84%. Alta de preços dos alimentos decorrente da queda da safra nos EUA e em outros países foi considerada a responsável pela alta da inflação. Porém, como explicar que diante de um crescimento tão baixo, o Brasil enfrente uma taxa de inflação até três vezes superior a de outros países como México, China, Colômbia ou Chile?

No período de 2000 a 2011 a agropecuária obteve ganho anual médio de produtividade de 3,9% e a indústria extrativa, 2,4%, mas na indústria em geral houve uma perda de -0,2% ao ano e no setor de serviços um crescimento muito baixo de apenas 0,7%.

A elevação de salários acima da inflação e do ganho de produtividade tem elevado os custos de vários setores, porém muitos preços industriais subiram abaixo da inflação em função da concorrência com os importados. Os serviços e alguns bens intermediários subiram muito acima da inflação e os efeitos acumulados os tornaram mais caros que os preços praticados no mercado internacional.

Os oligopólios, a pouca competição e o alto nível de fechamento *2 da economia brasileira interferem na decisão sobre a forma de se investir no Brasil - o investidor prefere adquirir capacidade instalada ao invés de expandi-la. Com a baixa competição, certas cadeias de suprimentos estruturadas em oligopólios e protegidas por barreiras diversas consolidam os preços internos mais altos. Nos últimos 7 anos, por exemplo, o setor automotivo foi moderadamente exposto à competição e seus preços nominais praticamente não subiram no período, porém os preços dos ônibus subiram acima de 90%. Outro exemplo simples, a areia, pedra, cimento, ferro e até mesmo os tijolos subiram quase o dobro da inflação nos últimos anos. Recentemente o governo sobretaxou a importação de tijolos - para que?

A execução do orçamento público

Na busca da melhoria da execução dos planos, o Plano de Aceleração do Crescimento – PAC centralizou a gestão de projetos e obras, porém, o fenômeno do baixo desempenho na execução dos orçamentos públicos de investimento se espalhou. Apesar dos recursos alocados para infraestrutura serem de menos de 2% do PIB, o governo federal, os estaduais e as estatais não têm conseguido executá-los, e tem ocorrido uma crescente elevação dos restos a pagar, que hoje atingem perto de 0,5% do PIB. Se não faltou dinheiro para as obras, o que faltou?

Os problemas e entraves aos investimentos são sérios, profundos, imbricados e de difícil solução no médio prazo. O Brasil possui legislação complexa, um sistema tributário desarticulado e uma burocracia pesada. Convive pacificamente com monopólios e oligopólios e, vez ou outra, adota barreiras às importações e de acesso ao mercado interno, entre outros aspectos.

Outra questão a ser considerada é que a oferta de serviços das projetistas, das firmas de engenharia e das locadoras de equipamentos é insuficiente. As estruturas das grandes empreiteiras estão intensamente ocupadas e o mercado de trabalho está apertado - faltam engenheiros e técnicos, entre outros profissionais.

Nos próximos 15 anos, seria necessário investir adicionalmente perto de 4,5% do PIB ou R$ 200 bilhões ao ano para o país crescer acima de 4% ao ano. A preferência deve ser o investimento no setor energético, portos, aeroportos, estradas, ferrovias, refino de petróleo, infraestrutura de tecnologia de informação e na formação de recursos humanos. Caso isto seja feito, a renda per capita poderia dobrar no período, enriquecendo o povo e as empresas. Porém, se com o atual volume de obras em andamento já não há capacidade de execução, como seria possível triplicá-la?

Os governos, diante desta fraca execução dos investimentos e da necessidade de capitais para complementar o baixo nível de poupança interna, estão adotando as concessões e Parcerias Público-Privadas - a conhecida PPP. O alerta é que ela isoladamente não é tábua de salvação para desemperrar as obras de infraestrutura. O mal que hoje atinge a execução das obras públicas, também atingirá as PPPs. Seria necessário um amplo esforço conjugado de medidas, que abrangeria:
- Modificar o modelo burocrático, regulatório e de “reserva de mercado”;
- Modificar a legislação das licitações para ampliar a concorrência e para limitar a “judicialização” dos processos;
- Ajustar os processos de concessão de licenças ambientais – não devemos abrir mão das questões ambientais, mas a legislação não pode ser um mero instrumento burocrático e alienado;
- Facilitar por um período determinado a entrada dos profissionais estrangeiros necessários ao desenvolvimento brasileiro, nos moldes adotados, por exemplo, pelo Canadá;
- Criar, mediante acordos diplomáticos, facilidades para o reconhecimento de títulos e atestados profissionais de estrangeiros;
- Modificar a legislação de entrada de empresas estrangeiras e/ou de sua associação com as empresas nacionais, entre outras.
Na década de 1990, os EUA legalizaram a entrada de milhões de trabalhadores formais para comporem sua força de trabalho e naquela década economia americana cresceu o equivalente a quase dois brasis de hoje.
No passado, diante de uma situação limite, o Brasil rompeu com arranjos estabelecidos. Os mais experientes se lembram da Lei 7.232 de 1984 de reserva de mercado de informática - o que teria acontecido se esta lei não tivesse sido abandonada?
O Brasil está diante de grandes dilemas econômicos e legais. Entre outras questões, deverá decidir se mantêm o fechamento do mercado aos oligopólios existentes, acatando suas limitações, ou se faz o mesmo que fez no passado com a Lei de Informática.

*1 - Os impactos da crise econômica global foram efetivos, mas segundo o CEPAL, o crescimento esperado em 2012 para nossos visinhos será muito superior ao nosso: Panamá 8%, Haiti 6%, Peru 5,7%, Bolívia 5,2%, Costa Rica 5%, Venezuela 5%, Chile 4,9%, México 4% e Argentina 3,5%.
*2 - Segundo o World Economic Forum as importações de bens e serviços em percentagem do PIB colocam o Brasil como o mais fechado do mundo entre os 144 países.

* Fausto Morey é consultor licenciado da Fundação Getúlio Vargas, servindo na assessoria técnica da Secretaria de Transportes Metropolitanos de São Paulo.

* Ponto de Vista - ANTP